POR MAURO S. ORUI
A preservação de veículos militares antigos no Brasil vai muito além do hobby é certamente uma paixão, que leva um proprietário de viaturas (termo correto) escavarem a historia militar e automobilística, tudo para alcançarem o Máximo possível a fidelidade de época.
E nesta viajem fascinante pela história que passa pela participação da FEB e FAB na segunda guerra e que traz também uma profunda admiração pela participação do Brasil da guerra. Conversamos com Marco Cesar Spinosa presidente da ABPVMA (Associação brasileira de veículos militares antigos).
Também mantém o Colégio Spinosa, participante do ¨GRUPO HISTÓRICO FEB¨ entusiastas pela história dos expedicionários na Itália. Seu grupo já esteve diversas vezes nos caminhos que a FEB realizou do desembarque em Nápoles a tomada de Monte Castelo, participando das comemorações e homenagens aos pracinhas que lá estiveram.
A receptividade do povo italiano para com os brasileiros que lá chegam é devido ao grande pessoa humana dos pracinhas, que além de tratarem a população com respeito e dignidade, também dividiram do próprio bornal com cidades inteiras por onde passaram. Criando profundos laços de gratidão e respeito pelo nosso povo e nação.
1.KOMMANDOS Gostaria que falasse rapidamente sobre o que você faz profissionalmente, onde nasceu etc.
– SPINOSA Ok Mauro, aproveito para agradecer o honroso convite para colaborar com a FEB; sou de São Paulo, capital, advogado, preservador de viatura militar e entusiasmado pela causa da FEB;
2. KOMMANDOS Como surgiu o interesse pela história militar em particular pela FEB?
– SPINOSA Isso me acompanha a vida toda; mas o que me inspirou de maneira marcante foi ter sido levado por meus pais a um desfile
de Sete de Setembro, na av. Nove de Julho, no qual pela primeira vez tive contato com o jipe e com as coisas do Exército Brasileiro; até hoje tenho na memória “os três jipinhos verdinhos de farol escondidinho com umas estrelinhas dentro de uma bolinha furada”, obviamente na visão de uma criança de uns seis ou sete anos…, a banda militar tocando um vibrante dobrado com a tropa marchando com muito garbo e vibração… e a Bandeira Nacional desfraldada à frente de tudo isso… e na companhia dos meus pais… uma caríssima recordação da minha infância.
Mais ou menos à essa época assisti a um filme estrelado pelo John Wayne, the Jet Pilot, na companhia de meus pais; fiquei fascinado pelo que vi, as fantásticas cenas de aviação; daí me interessei por revistas de quadrinhos, em especial a COMBATE, e cuja coleção mantive durante muito tempo; tinha os álbuns de figurinhas “Armas e Soldados” e “Bandeiras e Uniformes”… as chamadas “chapinhas Kibon de aviação”… , um documentário na televisão chamado “Memórias de Winston Churchill”, a famosa série “Combat” estrelada pelo Vic Morrow como o Sargento Saunders, com a clássica Lili Marlene como canção tema da série…e muitas outras passagens guardadas com carinho;
– A causa da FEB veio assim: minha avó Augusta, mãe de minha mãe, morava no bairro do Ipiranga e tinha uma amiga, a Dona Elsa, cujo esposo foi pracinha; a Dona Elsa sempre se referia a seu esposo Alcides com muito carinho e orgulho, fazendo menção a sua participação na guerra; não entendia o que era guerra, FEB mas…numa tarde de sábado acompanhei minha avó à casa da Dona Elsa, ocasião em que fui apresentado ao Sr. Alcides, com a recomendação de que não fizesse barulho nem falasse em alto tom, pois ele não podia com som alto (somente muuuuuuuuuuuito mais tarde vim a saber a razão dessa solicitação!); o Sr. Alcides fez a gentileza de me mostrar dois itens… fantásticos: um capacete e uma camisa verde!
Ele me explicou a finalidade do capacete, que estava bem usado, por sinal; quando o coloquei em minha cabeça fiquei impressionado com o peso da peça; o que marcou, de verdade, foi “a cobrinha verde” que vi no distintivo aplicado à manga da camisa! Ele me disse que “ a cobra tinha fumado na Europa” e que os brasileiros da FEB eram…sobreviventes!!! Não entendi isso, à época, mas a lembrança do distintivo é viva até hoje!!!
Lembro de que não era perfeito, seu contorno era irregular… mas foi a primeira vez que vi o distintivo da FEB!!!
3. KOMMANDOS como você vê o Brasil e seu povo em relação a história do Brasil na Segunda Guerra?
– SPINOSA Só tenho a lamentar o desconhecimento da maioria da população a esse respeito; o que os brasileiros fizeram lá na Itália foi digno de nota!!!
O Brasil era subdesenvolvido, essencialmente agrário, carente de saúde pública e infra estrutura adequadas, dentre outros fatores, e suas forças armadas eram incipientes; daí, recrutar, selecionar, equipar, treinar e remeter ao exterior uma força expedicionária para lutar contra um inimigo muito bem treinado, já envolvido em ações de combate por longo período, e sem armamento adequado, ressalte-se… não foi para qualquer um!!! Por essa razão o fato deveria ser muito valorizado, o que é uma pena; mas, por onde tenho andado e comento a respeito, o interesse é grande, sempre ouvindo…
“- FEB? Já ouvi falar… pode me esclarecer a respeito?”; aí então… faço o relato de uma história de grande significado para a grande nação brasileira, uma vez que os ensinamentos e vivência, principalmente na FAB, adquiridos no período permearam gerações de novos oficiais, sem contar o grande aprimoramento na doutrina e operacionalidade das forças armadas; a menção feita à FAB deveu-se ao fato de, ao retornar da Itália, todos o grupo de caça ter sido concentrado na Base Aérea de Santa Cruz, o que permitindo que a doutrina fosse incorporada e difundida dentro da força em pouco tempo, ao contrário do que aconteceu no Exército, que ou dispensou enorme contingente de oficiais, graduados e praças, ou espalhou estes pelo território nacional sem que a experiência pudesse ser ou aproveitada, ou difundida em benefício da própria força terrestre.
4. KOMMANDOS Que mais seria necessário para levarmos a história do nosso país as novas gerações?
– SPINOSA o ensino!! Se os livros didáticos contivessem menção a esse fato, e se as associações de veteranos tivessem mais apoio oficial, o reconhecimento seria, sem sombra de dúvidas, mais relevante.
5. KOMMANDOS De que forma o reenacting colabora com isso?
– SPINOSA a REENCENAÇÃO HISTÓRICA, ou reenacting, traz para o grande público a denominada “história viva”, ou seja, a apresentação de indumentária e objetos usados em um determinado período da história para o momento presente; é forma bastante agradável de “contar a história”.
Merece destaque, entrementes, o cuidado e zelo com que o assunto deve ser tratado por parte de quem pratica esse hobby, pois há que se haver consonância entre o momento da História a ser representado e os trajes, objetos e equipamentos a serem apresentados ao público, sem deixar de mencionar o absoluto respeito e responsabilidade que dever observados por quem o prática.
Daí ser mandatório: usar trajes, objetos e equipamentos SOMENTE NO ÂMBITO DE EVENTO QUE TRATE DO ASSUNTO, E QUE JAMAIS SE FAÇA USO DESSES NO DIA A DIA EM AMBIENTE/LOCAL SEM RELAÇÃO COM O ASSUNTO!!!
Incorporei a reencenação histórica pela relação dela com as miniaturas de avião que montei ao longo de minha vida, pelos livros de história militar e de aviação lidos, que sempre me fascinaram e me levaram a imaginar como seria usar os equipamentos e uniformes; daí, ao conhecer pessoas com afinidade nesse momento da história, que preservem veículos militares, a atividade passou a fazer parte da minha vida, mas observando-se, diga-se, o respeito e responsabilidade pertinentes.
6. KOMMANDOS Qual a relação da associações de colecionadores veículos militares antigos com os demais grupos históricos?
– SPINOSA um exército, para alcançar seus objetivos, tem de ter mobilidade no campo de batalha para alcançar os objetivos estratégicos e táticos propostos; para isso… as viaturas militares são imprescindíveis, quer sejam elas de serviço, transporte ou combate; daí a perfeita relação entre reencenação histórica e preservação de veículos militares.
KOMMANDOS Por fim gostaria que menciona-se algum fato ou história pitoresca, curiosa ou que marcou a viajem pela Itália em relação a FEB.
– SPINOSA foram tantos… mas o mais marcante foi o carinho, respeito e reverencia do italiano para com as coisas da FEB. Por onde a FEB passou, e por onde passei que a FEB passou, as histórias sempre brotaram com espontaneidade e calor humano!
Fiz grandes amigos aqui no Brasil, por conta disso, tive o privilégio de conhecer o músico João Barone, filho de pracinha, e que leva a causa da FEB adiante com muito entusiasmo; conheci brasileiros dos quatro cantos do país entusiasmadíssimos com essa causa, e com os quais tive a satisfação de percorrer os Caminhos da FEB numa vivência única e inesquecível; participei da criação do Grupo Histórico FEB, justamente para levar às novas gerações essa magnífica página de nossa história; conheci sobreviventes dessa história, os quais deram depoimentos emocionados acerca dos fatos ocorridos então; Menciono, ainda, o fato de que o mais entusiasmado preservador de coisas da FEB está na Itália, o querido Giovanni Sulla, e que o Monumento Brasileiro Votivo Militar , na Itália, é guardado por filho de pracinha, o querido Mário Pereira, a quem registro o meu muito obrigado pelo grande serviço prestado para a memória da FEB.