index_clip_image006

A Força Expedicionária Brasileira em Campanha na Itália Durante a Segunda Guerra – 1944-1945

Eu estava relendo mais uma vez o livro “A Luta dos Pracinhas” – 3ª Edição e me deparei com esse texto abaixo escrito por Frank D. McCann e apresentando na Conferência de Historiadores do Exército Em Washington, D.C., em 9 de junho de 1992, e achei legal compartilhar aqui no Ecos da Segunda Guerra.

A Força Expedicionária Brasileira na Campanha Italiana – 1944-1945

Hoje em dia, a maioria dos americanos se surpreende ao saber que o Brasil empregou tropas na II Guerra Mundial. Os que pertencem à geração da guerra podem ter uma vaga recordação, mas os americanos nascidos depois, aqueles que sabem que houve uma Força Expedicionária Brasileira na frente italiana, geralmente tomaram conhecimento do fato através de algum parente que tenha servido na 10.” Divisão de Montanha, no 4? Corpo, ou em alguma unidade integrante do 5? Exército. As histórias da guerra raramente mencionam este fato, ou, na verdade, qualquer das outras contribuições do Brasil à causa aliada. É certo que a FEB não alterou o curso da campanha italiana ou da guerra na Europa. Não, o seu significado reside menos na história da guerra que na história das relações brasileiro-americanas e na história do Brasil. Nestas duas áreas, seu peso é considerável, ainda que o povo americano em geral e a maioria dos estudiosos a ignorem. Mas a FEB proporcionou, de fato, aos exercícios americano e brasileiro, experiência na criação e operação de forças militares internacionais.

index_clip_image006

A FEB representa um caso insólito na história militar americana. Não se tratava de uma força colonial como o foram as unidades britâ­nicas indianas, ou integrante do Commonwealth como as tropas do Canadá, Nova Zelândia ou África do Sul, nem nada do tipo “Livre” como os contingentes da Polónia ou França; não, a FEB foi uma divi­são extraída do Exército de um estado soberano e independente que voluntariamente colocou seus homens sob comando americano. Mas não foi apenas o comando a única coisa envolvida no relacionamento; a FEB foi orientada, treinada, equipada, uniformizada, calçada e ali­mentada pelos americanos. O relacionamento não poderia ter sido mais íntimo, e ainda assim foi mantida a integridade da estrutura de comando da força. A despeito do alto nível de integração, a FEB nunca perdeu sua identidade como brasileira, e os americanos nunca a viram de ou­tro modo.

POR QUE A FEB?

A primeira pergunta que os americanos (e jovens brasileiros) ge­ralmente fazem é: por que houve uma FEB? São diversas as razões: a reação emocional do povo brasileiro à guerra; os objetivos dos líde­res civis e militares brasileiros; e os objetivos dos Estados Unidos. O povo brasileiro enfureceu-se com o afundamento de navios por sub­marinos do Eixo, o que levou ao reconhecimento de um estado de guerra com a Alemanha e a Itália em agosto de 1942; a FEB foi um ato de vingança, um modo de restabelecer a honra nacional, ao mesmo tem­po em que contribuía com a grande luta para salvar a civilização. Pelo menos foi assim que a propaganda do governo a apresentou.

O presidente Getúlio Vargas e seu ministro das Relações Exterio­res, Oswaldo Aranha, preocupados com as futuras negociações de paz, com a reorganização do mundo no pós-guerra, e conhecedores das di­ficuldades que o Brasil enfrentara após a I Grande Guerra, sem dela ter participado militarmente, optaram pelo engajamento na campanha. Franklin Roosevelt encorajou esta linha de raciocínio, dizendo a Var­gas, durante o encontro que tiveram em Natal, em fevereiro de 1943, que o queria ao seu lado na Conferência de Paz. Além disso, Vargas provavelmente teria nutrido esperanças de distrair os militares com a finalidade de assegurar para si mais espaço político no qual pudesse organizar uma base populista para prosseguir com o que via como os benefícios do seu regime ditatorial. Seus oponentes logo enxergaram na FEB uma garantia de que o regime não sobreviveria à guerra. Ale­gavam que os brasileiros não poderiam lutar contra uma tirania no es­trangeiro e continuar vivendo sob uma tirania na sua própria terra.

O ministro das Relações Exteriores, Oswaldo Aranha, viu a guer­ra e a FEB como um modo de expandir a histórica cooperação do Bra­sil com os Estados Unidos, transformando-a numa “verdadeira aliança de destinos”. Essa política de cooperação tinha se constituído, segun­do Aranha, “em uma fonte de segurança” para o país, já que, dando aos Estados Unidos a certeza do apoio brasileiro em questões interna­cionais, poderíamos “contar com eles nas questões [sul-]americanas”. A FEB, no seu modo de ver, convenceria os americanos de que o Bra­sil estava comprometido “material, moral e militarmente” com uma aliança que era sua estratégia para ganhar a ajuda dos Estados Unidos à industrialização brasileira, o que ele via como “a primeira defesa con­tra o perigo externo e interno”. Aranha argumentava que a FEB era o começo de uma colaboração mais ampla envolvendo a total reorga­nização militar do Brasil. Mais ainda, ele não acreditava que o Brasil pudesse ficar restrito exclusivamente a uma força expedicionária, caso desejasse assegurar o envolvimento americano em outras questões mi­litares, como a expansão de sua Marinha e Força Aérea e a defesa do sul do país. Contemplando o futuro, ele acreditava que o Brasil teria que conservar suas forças mobilizadas por algum tempo após a paz, a fim de ajudar a manter a ordem no pós-guerra. Juntamente com ou­tros ministros, asseverava que deveriam trabalhar para convencer os americanos de que, “tendo escolhido a estrada a seguir e os nossos com­panheiros de jornada, não alteraremos o nosso curso ou hesitaremos em nossos passos”.

membros-da-artilharia-da-feb-na-italia-1944-1945-s-l-cpdoc-hb-foto-062-16

Para alguns oficiais brasileiros, especialmente os formados na tur­ma de 1917 da Escola Militar, o envio de tropas era uma espécie de compensação por não terem lutado na I Grande Guerra, algo como um modo de vingar as mortes de amigos e colegas nos ataques dos sub­marinos do Eixo e, talvez mais importante, um meio de aumentar o poder militar do Exército e da Força Aérea e sua capacidade de lidar com diversas eventualidades. Entre estas, estavam as fortes bases mili­tares e navais dos Estados Unidos no Nordeste do Brasil, que os brasi­leiros queriam ver desativadas após a guerra; as populações imigrantes da Alemanha, no Sul do país, que os brasileiros queriam ser capazes de controlar; e o sempre presente medo da Argentina, à época sob regime militar. Mas o Exército não ia se deslocar para o exterior e con­fiar que tudo ficaria bem no país ou em suas fronteiras. Seus líderes preocupavam-se particularmente com a Argentina. Em julho de 1943, o ministro da Guerra, General Eurico Dutra, declarou que, fosse qual fosse o efetivo das tropas enviadas para o exterior, uma força equiva­lente deveria permanecer no Brasil “para garantir a soberania e a ma­nutenção da ordem e tranquilidade aqui”. Era evidente que a frente interna tinha que ter segurança, mas para atingir este objetivo os líde­res brasileiros teriam que conseguir armas suficientes com os america­nos, que estavam então lutando para armar suas próprias tropas e produzir armas destinadas aos aliados. O governo brasileiro decidiu que teria de mandar uma força militar para o campo de batalha.

A FEB logo atraiu o apoio do governo americano; afinal, a parti­cipação do maior país latino-americano no conflito ao lado dos Alia­dos reforçaria a imagem dos Estados Unidos como líder do hemisfério. Washington esperava também que isso tornasse o Brasil um bastião pró-americanos na América do Sul. O secretário de Estado Cordel Hull via o Brasil como um contrapeso para a Argentina. Tanto brasileiros quanto americanos usaram engenhosamente suas preocupações com a Argentina para fortalecer seus objetivos políticos. Mas, obviamente, quanto mais próximo se tornavam Brasil e Estados Unidos, mais in­quietos ficavam os argentinos.

Alguns líderes do Exército americano tiveram que ser persuadi­dos a aceitar a oferta brasileira de tropas. Sua disposição para atender os brasileiros era diretamente proporcional ao que desejavam deles. Ao final de 1942, o Exército tinha suas bases aéreas brasileiras e linhas de suprimento por elas servidas para a África do Norte; por que então se preocupar com os brasileiros? Teve lugar um debate entre militares e diplomatas americanos sobre a conveniência de aceitar ou não a von­tade dos brasileiros. No início de 1942, os dois lados discutiram a ocu­pação pelos brasileiros das guianas Francesa e Holandesa, e em fevereiro de 1943, na cidade de Natal, Roosevelt sugeriu a Vargas que o Brasil substituísse as tropas de Portugal nos Açores e na Madeira, de modo que os portugueses pudessem reforçar suas defesas na Europa. Nada adveio dessas ideias, mas após a Conferência de Natal, a questão não era mais se o Brasil mandaria tropas, mas para onde elas iriam.

Em meados de abril de 1943, o representante militar brasileiro em Washington, General Estevão Leitão de Carvalho, disse ao Chefe do Estado-Maior George Marshall que o Brasil queria formar uma cor­poração de três ou quatro divisões, e em maio o Estado-Maior Con­junto aprovou a ideia.

O importante ponto a ressaltar é que a FEB foi uma ideia brasilei­ra, que resultou de um plano deliberado do governo Vargas e não de • uma manobra americana para envolver o Brasil diretamente em combate

COMO A FEB FOI FORMADA?

Havia uma certa divergência de opinião entre brasileiros e ameri­canos sobre que tropas deveriam ser usadas para formar a força ex­pedicionária. Os americanos, e a Comissão de Defesa Conjunta Brasil-Estados Unidos, consideravam lógico que fossem usadas as unidades do Nordeste, mas os brasileiros, vendo os 15 mil militares americanos distribuídos em bases daquela região, pensavam de forma diferente. O ministro Dutra queria construir três campos regionais de treinamen­to para preparar três divisões simultaneamente, criando assim instala­ções úteis para o pós-guerra. Mas os Estados Unidos não podiam fornecer as armas e o equipamento necessários para guarnecer três cam­pos, ou seja, 50% do equipamento das três divisões. Além disso, co­mo nem Brasil nem Estados Unidos tinham navios suficientes para transportar sequer uma divisão inteira de uma só vez, o Pentágono sur­giu com a ideia de fornecer 50% do equipamento de uma divisão para treinamento, material este que seria deixado para trás visando ao trei­namento das outras divisões. Todas seriam armadas e equipadas no teatro de operações.

Pouco antes de visitar os Estados Unidos em agosto de 1943, o General Dutra, ministro da Guerra, que queria comandar o Corpo de Exército planejado, sondou vários generais quanto ao interesse destes em comandar uma das divisões. O General João Baptista Mascarenhas de Moraes, que comandara a Região Militar do Nordeste (a 7?) de ju­nho de 1940 a janeiro de 1943, respondeu imediatamente, enquanto os outros hesitavam. Finalmente, dois outros comandantes de divisão foram designados, e os preparativos tiveram início; mas os planos não foram realizados, e a FEB ficou limitada a uma divisão.

O Exército brasileiro de 1943 não tinha divisões regulares prontas para treinamento intensificado e transporte, sendo organizadas em co­mandos estáticos distribuídos pelas regiões geográficas que enquadra­vam unidades equivalentes a regimentos dispersamente localizadas. Estas, por sua vez, eram sediadas em quartéis que quase sempre não dispunham de espaço suficiente para receber acréscimos em seus efetivos ou para permitir o tipo de treinamento que o Exército americano estava recebendo então. Além do mais, a maioria desses quartéis fica­va em áreas urbanas. E como os soldados eram recrutados principal­mente na localidade, formar uma divisão numa só região representaria um sacrifício politicamente inaceitável para essa região. Assim, a relu­tância em usar as unidades nordestinas era relacionada com mais coi­sas do que a preocupação com a presença americana.

Para formar a FEB foram requisitadas unidades oriundas de vá­rios pontos do Brasil. O lado negativo disto era que essas unidades não estavam acostumadas a trabalhar juntas. Do lado positivo, podia-se argumentar que, como o Exército vinha sendo treinado e organizado segundo o modelo francês desde 1919, seria mais fácil mudar para o modelo americano se a divisão fosse composta por unidades sem uma experiência conjunta anterior. Talvez se adaptassem mais depressa.

Estranhamente, em vez de usar a experiência de combate para au­mentar a profissionalização do maior número possível de oficiais su­balternos regulares, o Exército convocou uma quantidade considerável de oficiais da reserva, muitos dos quais exercendo atividades na vida civil. Dos 870 oficiais de Infantaria de linha na FEB, pelo menos 302 eram reservistas. Para felicidade dos historiadores, um grupo deles pro­duziu um dos livros mais úteis sobre a FEB. Não ficou claro se foi uma decisão política ou puramente administrativa. Mas parece que realmente não havia um número suficiente de oficiais subalternos para integrar a força expedicionária. Mais tarde, na Itália, referindo-se à escassez de diplomados pela escola militar e às deficiências profissionais dos oficiais da reserva, Mascarenhas pediu, já em abril de 1945, que fos­sem comissionados sessenta sargentos de Infantaria para servir como comandantes de pelotão.

Houve também considerável dificuldade no preenchimento das fi­leiras das unidades designadas. Na falta de unidades de Polícia do Exér­cito, o Exército recrutou policiais de São Paulo, criou unidades de comunicações com homens das companhias de eletricidade e telefonia, e organizou um destacamento de enfermeiras através de recrutamento público de mulheres interessadas. O fato dos conscritos serem manda­dos para o exterior encorajou muitos a buscar meios de escapar ao ser­viço, mas como o sistema de conscrição fora imposto em 1916, a evasão do dever militar sempre fora grande. Por exemplo, na 7? Região Mili­tar, no Nordeste, enquanto Mascarenhas foi seu comandante, o recru­tamento de 7.898 homens em 1941 teve uma taxa de evasão de 48,9%, e dos que se apresentaram, um total de 41% era de incapazes por mo­tivo de saúde. Na verdade, isto chegou a ser um progresso, já que no ano anterior a taxa de evasão fora de 68%! Entre os 3.434 voluntários daquela região, 2.201 (64%) foram considerados aptos para o serviço. Estes números podem ser tomados como bastante típicos da experiên­cia nacional. A taxa de rejeição por motivos médicos e de saúde era alta tanto para conscritos quanto para soldados já em serviço ativo. Na formação de um dos escalões posteriores da FEB, foram examina­dos 18 mil soldados em unidades regulares para que se obtivessem 6 mil homens. No caso do quarto escalão, os 10 mil soldados examina­dos resultaram em apenas 4.500 aptos para embarque. Como já co­mentei em outra parte, com mais detalhe, o recrutamento e o exame médico da FEB, basta referir aqui que o difícil encontro com o mau estado de saúde da nação contribuiu para a decisão de não se prosse­guir com a mobilização. Em janeiro de 1945, o General Ralph Wooten observou que o Exército brasileiro estava “perto do fundo do poço” no fornecimento de pessoal combatente e que era “um erro esperar qualquer ajuda adicional do Brasil neste aspecto”.

O treinamento funcionou em níveis múltiplos. Oficiais brasileiros eram mandados para cursos nos Estados Unidos desde 1938, a maio­ria cursos de artilharia de costa e aviação. Na verdade, no início de 1941, bem antes de Pearl Harboúr, o Brasil estava mandando grupos de oficiais para treinamento em diversas especialidades. O ritmo continuou acelerado, e pelo final de 1944, o número de militares brasilei­ros que tinham ido para os Estados Unidos passava de mil. Um curso especial para brasileiros foi criado na Escola de Comando e Estado-Maior em Fort Leavenworth, que matriculou 259 oficiais, o maior con­tingente de qualquer nação estrangeira a passar por suas salas de aula. O comandante da escola disse que os brasileiros que já haviam com­pletado seu próprio curso de estado-maior, com três anos de duração, “sabiam mais que a maioria dos seus instrutores”.

O efetivo mandado para a Itália em cinco escalões representou um total de 25.334 homens. Em julho de 1944, o primeiro escalão chegou a Nápoles. Após alguns atrasos com equipamento e treinamento, no dia 15 de setembro daquele ano 06? Regimento de Infantaria e tropas de apoio, sob o comando do General-de-Brigada Euclydes Zenóbio da Costa integrou-se ao 4? Corpo do 5? Exército dos EUA. O Coman­dante do Exército, Mark Clark, decidiu por este tipo de solução por­que precisava reforçar o 4? Corpo, cujo efetivo declinara praticamente ao nível de uma divisão reforçada por causa das unidades designadas para a invasão do sul da França em julho pelo 7? Exército. O 5? Exér­cito tinha perdido sete divisões completas para a operação francesa, de modo que a chegada dos brasileiros naquele momento foi oportu­na. O 5? Exército americano e o 8? Exército inglês estavam preparan­do uma incursão sobre a Linha Gótica dos alemães, numa tentativa de chegar ao Vale do Pó e a Bolonha antes do Natal. Os três corpos do 5? Exército (de oeste para leste: 4?, americano; 2°, americano; e 12?, britânico) atacariam com o segundo corpo como vanguarda e o 4? imobilizando e importunando os alemães antes. Clark imaginou que isto daria aos brasileiros uma entrada relativamente suave no combate.

Ë interessante observar as diferentes reações de brasileiros e ame­ricanos à ação subsequente. Os brasileiros progrediram muito bem per­seguindo unidades alemãs em retirada de 16 a 30 de outubro, quando sofreram um contra-ataque súbito que conseguiram conter durante cerca de dez horas até que ficaram com pouca munição e se viram forçados a recuar. Pêlos registros americanos, podemos notar que isso foi con­siderado como uma ocorrência normal de combate, mas as narrativas publicadas por oficiais brasileiros são cheias de acusações e asperezas. No local da ação, Mascarenhas culpou e repreendeu a tropa pela sua falta de cuidado e por ter fugido ante um “inimigo desmoralizado”. Claro que ele estava ansioso para que sua tropa se saísse bem, e ele próprio ainda era um tanto inexperiente no que dizia respeito à natu­reza daquela guerra. O fato é que os brasileiros se saíram tão bem quan­to qualquer outra tropa teria se saído naquelas circunstâncias. A 92º Divisão dos EUA que os substituiu, quando se deslocaram para o vale do Reno, também foi incapaz de expulsar os alemães da linha de crista que conservaram em seu poder nos cinco meses seguintes.

COMO A FEB SE SAIU?

O que acaba de ser dito leva à seguinte pergunta, que é comumente feita sobre a FEB: como foi que ela se saiu? A resposta curta é mui­to bem. Mas não estamos aqui para respostas curtas.

O papel da FEB foi tático, o grosso da sua experiência de comba­te ficando no nível pelotão. O diário de combate da divisão é basica­mente um sumário de ações de patrulha, como foi o caso para o 5? Exército, de um modo geral, no outono e inverno de 1944-1945. Os brasileiros reconheceram isto e não afirmam que seu papel ou o im­pacto da sua atuação tenha sido estratégico. Em suas memórias, o chefe do estado-maior da divisão, Floriano de Lima Brayner, observou que “em nenhuma ocasião a FEB se engajou em operações de nível estra­tégico”. E depois da guerra, para simbolizar o nível do papel desem­penhado pela divisão expedicionária, o Exército construiu um mo­numento em homenagem aos tenentes da FEB na Academia Militar das Agulhas Negras. Na verdade, é difícil imaginar como uma divisão poderia ter desempenhado qualquer outro papel senão tático na cam­panha do norte da Itália.

Este ponto tem sido desconsiderado por alguns observadores, tais como o jornalista William Waack, cujo livro As duas faces da glória: A FEB vista pêlos seus aliados e inimigos” parece baseado na premissa de que os brasileiros atribuíram à FEB uma importância maior do que ela realmente teve. Ele contrasta a falta de reconhecimento e memória de alguns veteranos alemães e o agudo criticismo dos relatórios ameri­canos de ligação e inspeção com a “grandioloqüência” das narrativas brasileiras sobre a FEB. Por ter este livro sido publicado por uma das mais importantes editoras brasileiras, e porque teve algum impacto nos círculos académicos, farei alguns comentários sobre a sua utilidade ou inutilidade.

A julgar pelas aparências, Waack preencheu o vazio da bibliogra­fia disponível em português examinando documentos alemães e ameri­canos e entrevistando sobreviventes das unidades alemãs. Muito dês sem primeiro ler a literatura existente, o que lhes permitiria distin­guir o que era novo e lhes daria a capacidade de colocar o novo numa perspectiva adequada. O autor também ficou satisfeito por ter encon­trado alguns documentos interessantes, e não questionou sua totalidade.

FEB

Ele observou que a principal divisão alemã que se defrontava com os brasileiros era composta de um grande número de soldados muito jovens e soldados bastante velhos, e que era comandada por oficiais que tinham servido longos anos e sobrevivido aos rigores da frente russa. Ele retratou esses homens como acabados, quando poderia ter nota­do, que, cansados ou mesmo com fadiga de combate, eram veteranos com uma experiência de combate incomensuravelmente maior que a de seus oponentes brasileiros. Se tivesse lido mais a respeito da campa­nha italiana, teria percebido que não havia descoberto nada de novo. Afinal de contas, os alemães lutavam em três frentes em 1944-1945 e estavam empregando na luta todo e qualquer homem disponível.

Waack dedicou diversas páginas à importância da conquista pela FEB de uma elevação conhecida como Monte Castelo, por ele referida como “a maior glória da história contemporânea do Exército brasilei­ro”. Ele escreve em seu livro que “há uma tendência acentuada para considerar a conquista de Monte Castelo como um passo importante no avanço aliado no norte da Itália, às vezes atribuindo-se a essa con­quista uma importância estratégica decisiva”. Erroneamente, ele men­ciona como exemplo o livro de Lima Brayner, que, conforme comentei antes, limita cuidadosamente o significado de tais batalhas além do con­texto brasileiro. Estranhamente, considerando-se a existência de uma vasta bibliografia produzida por veteranos da FEB, Waack cita como exemplo recente desta tendência uma tese de doutorado datada de 1982 e pobre de fontes, apresentada na Universidade de São Paulo, para afirmar que “Monte Castelo(…) era a chave de um sistema defensivo(…) à entrada da planície do legendário rio Pó”.

Prossegue, então, questionando a importância da vitória, mostran­do que para os alemães “Monte Castelo” não existia; “seu nome”, afirma ele, “não aparece em qualquer comunicação oficial das divi­sões, exércitos, e muito menos nos volumosos ‘Diários de Guerra da Wehrmacht’. Para eles, era meramente o ponto “101/19” em seus ma­pas de guerra. Os alemães consideravam suas posições nas montanhas fundamentais para a defesa do Vale do Pó, e entendiam, diz Waack, que a “nervura central” da sua defesa corria de Monte Belvedere ao longo das elevações para leste. O ponto-chave para eles não era Monte Castelo e sim Belvedere. Waack imagina estar, assim retificando o re­gistro histórico. Mas se tivesse se dado ao trabalho de consultar outros documentos, além dos poucos que leu para examinar o diário de guer­ra da FEB, todos americanos, teria notado que no final de 1944 o com­bate tinha ficado paralisado, não apenas na FEB como também no 4? Corpo e no 5? Exército, com a FEB atacando “a linha de crista M. TORRACCIA—M. BELVEDERE”. A primeira menção a “M. CAS­TELO” veio em 21 de fevereiro de 1945, quando a FEB “atacou ao longo das encostas sul da ravina entre BELVEDERE e M. delia TOR­RACCIA” para conquistar “M. CASTELO(568192), a elevação do ter­reno logo a noroeste de ABETAIA”. Minha opinião é de que seria natural para os brasileiros dar mais importância aos nomes do terreno com que se defrontavam, ao contrário dos defensores alemães ou dos americanos, que estavam preocupados com uma frente mais ampla. O autor do diário do destacamento de ligação americano prossegue co­mentando que “aquela elevação foi objeto de dois ataques anteriores brasileiros, nos quais sofreram um número considerável de baixas, re­presentando a sua captura uma nítida perda para o inimigo, já que o privava de seu último bom posto de observação de BAGNI delia FORRETA”.

Waack também procurou minimizar a importância da vitória ob­servando que os veteranos alemães lhe disseram que raramente tinham mais de cinquenta homens guarnecendo qualquer posição naquela área.Ele não levou em conta que aqueles grupos de cinquenta controlavam elevações de onde disparavam ao longo de trajetórias predeterminadas que cobriam todos os acessos. É fato tão sabido na cultura militar que são necessários menos homens para defender posições elevadas do que para conquistá-las, que é quase embaraçoso realçá-lo. Mas, de qual­quer modo, a informação de Waack não é nova, pois a história do 4? Corpo analisando as defesas alemãs menciona que a 232ª Divisão de Granadeiros “estava tenuemente espalhada ao longo de uma frente de 18 milhas”, [ênfase acrescentada]

Waack deixou de observar o tipo de armamento que os alemães estavam usando para defender suas posições. A história do 4° Corpo diz que as fotos de informações revelaram que “os alemães também perceberam a importância tática daquela crista, tendo concentrado um grande número de peças de artilharia na área de Campiano— Belvedere—Castelo; ao todo, havia 97 canhões em posição”. Grande parte do plano de batalha do Corpo era baseada na cuidadosa ponta­ria dos artilheiros para destruir os canhões alemães, mas, significati­vamente, isto teria lugar durante o ataque do dia 18 de fevereiro, e não na sua preparação, de modo a preservar o elemento surpresa para a ofensiva inicial da infantaria. Com seus dados de tiro predeterminados, a artilharia do Corpo concentraria o fogo sobre a artilharia ger­mânica quando esta entrasse em ação. A ênfase colocada na artilharia no plano de batalha do Corpo indica o grau de importância que os ame­ricanos atribuíam ao armamento alemão e suas posições de tiro.

Waack resume sua crítica ao episódio de Monte Castelo declaran­do que, “baseado na narrativa alemã e na topografia, “em Monte Cas­telo os brasileiros desempenharam uma missão tática secundária, uma manobra que colaborava com o ataque principal(…)[e] não foi um com­bate decisivo ou tampouco influenciou fundamentalmente o resultado da batalha”. Curiosamente, ele registra algo que levaria um historia­dor profissional a ter muito cuidado, ou seja, que os arquivos alemães relativos à queda de Belvedere, Castelo e Torraccia foram destruídos em um incêndio após a guerra.

Agora, sem dúvida nenhuma, muito foi feito de Monte Castelo pêlos febianos e pelos militares brasileiros. Para eles, o engajamento bem-sucedido teve grande importância simbólica. Sua participação na conquista de Belvedere—Castelo convenceu os brasileiros de que eles estavam à altura da tarefa a que tinham se lançado. Talvez se possa fazer uma comparação grosso modo com a importância de BELLEAU WOOD (junho de 1918) para os americanos na I Grande Guerra. O fato é que a FEB e a 10? Divisão de Montanha dos EUA foram efeti-vas na operação conjunta que desalojou os alemães de elevações im­portantes, permitindo assim que a ofensiva de primavera fosse desencadeada. Se uma dessas duas divisões tivesse falhado, a ofensiva teria sido adiada.”

Qual seria a visão dos americanos sobre a FEB? Esta é uma per­gunta que deve primeiramente ser respondida com as respostas a ou­tras perguntas: que americanos? Quando? O quê? Por quê? Do princípio ao fim, os militares americanos estudaram e prepararam re­latórios sobre as origens, formação, pessoal, preparo e funcionamen­to das forças brasileiras. Quem quer que seja familiarizado com os militares americanos e seus arquivos não acha nada de incomum nis­so. Todos os aspectos da formação e funcionamento das unidades ame­ricanas também eram acompanhados de perto e mereciam muitos relatórios. Mas usar este material para finalidades históricas requer uma cuidadosa atenção ao contexto. É de se esperar que os relatórios inter­mediários provavelmente contenham comentários negativos, e assim o historiador cuidadoso irá procurar os relatórios finais, que contam como o processo se realizou.

William Waack “descobriu” relatórios do Destacamento de Li­gação brasileiro do 5? Exército (que, devo observar, usei em meu trabalho datado de 1973 intitulado Brazilian-American Alliance), e, ob­servando que não tinham sido publicados no Brasil, perguntou-se se o Exército brasileiro da época teria conhecimento da existência de uma “contradição entre o louvor público dos generais e as críticas severas escritas pelos oficiais americanos incumbidos de acompanhar ou ins­truir os militares brasileiros”. Ele extrai longas citações desses docu­mentos e compara as atitudes americanas com as brasileiras. Esses relatórios contêm uma linguagem forte redigida por homens que esta­vam preocupados com a qualidade do treinamento que a FEB estava recebendo. Não hesitam em apontar incompetência quando a encon­tram, ou erros, assim como sugerir soluções. Sua queixa mais comum era de que a tropa brasileira não era suficientemente treinada, e a solu­ção que apresentavam a praticamente todos os problemas era coope­ração e treinamento. O Exército americano, tal como a sociedade que o produziu, acreditava em educação, e a linguagem da escola estava sempre presente.

Seria um erro, contudo, presumir que os americanos conservas­sem para si o conteúdo desses relatórios. A unidade de ligação que os preparou era subordinada às Forças do Exército dos Estados Unidos — Atlântico Sul, sediadas em Recife sob o comando do General Ralph H. Wooten, que no mínimo resumiu oralmente o que diziam para o Ministro da Guerra, General Eurico Dutra. Em uma conversa de ja­neiro de 1945, ele disse a Dutra que as operações na Itália tinham reve­lado “falta de liderança nos níveis dos oficiais subalternos e sargentos”, que havia necessidade de “mais descentralização de autoridade”, e que era preciso “mais treinamento no cuidado e manutenção do equipa­mento, viaturas e outros equipamentos técnicos, mais treinamento tam­bém em controle sanitário e a necessidade de estabelecer-se um sistema de inspeções e acompanhamento mais adequado”. Dutra respondeu que reconhecia a necessidade de prestar mais atenção a esses assuntos e que tomaria providências para corrigi-los.”

foto_vitoria

Waack acertou ao dizer que a ideologia militar americana era de que a vitória seria possível se os meios necessários fossem empregados adequadamente. E o emprego adequado era resultado de “treinamen­to, treinamento e mais treinamento”. Seu ressentimento em relação ao “paternalismo” e à “arrogância” americanos (p. 154) foi comparti­lhado durante a campanha por alguns oficiais brasileiros, como o Chefe do Estado-Maior Lima Brayner, que considerava as exigências ameri­canas de treinamento constante, mesmo para os soldados da linha de frente, uma “imposição humilhante” feita a uma tropa que não tivera um dia de descanso em quatro meses. O que precisa ser admitido é que essa tropa fora treinada desigualmente, que alguns soldados realmente tinham sido mandados para a Itália sem treinamento básico, e que den­tro da própria FEB alguns oficiais reconheciam isto e outros não. O Coronel Brayner estava engajado em sua guerra burocrática particular com o oficial de operações da divisão, o Coronel Humberto Castello Branco, partidário do treinamento constante. O General Mascarenhas, comandante da FEB, referindo-se ao efetivo para recompletamento trei­nado na área de retaguarda da Itália, admitiu para oficiais americanos que os únicos elementos treinados da força nunca haviam entrado em combate. Ao extrair os relatórios do seu contexto e exibi-los perante a opinião pública brasileira, dando a entender que representavam a ver­dadeira, se bem que secreta, opinião americana sobre a FEB, Waack violentou a verdade histórica e perdeu a oportunidade de elevar o nível de sofisticação da historiografia da participação brasileira na guerra.

Os relatórios americanos indicavam um profundo desejo de que a FEB tivesse êxito. Os oficiais americanos tinham consciência de que o sucesso ou o fracasso da força brasileira afetaria as relações futuras entre os dois países. O comandante do 5? Exército, General Mark Clark, observou em seu diário que “lidar” com os brasileiros “é uma coisa muito delicada e deve ser feita direito”. Além disso, é claro que o fra­casso da FEB macularia os oficiais americanos que trabalhavam com os brasileiros, de modo que era do seu interesse pessoal vê-los bem-sucedidos. Um exemplo desta preocupação foi dado no final de 1944, quando todo o estado-maior do 4? Corpo, com regularidade, “visita­va, conferenciava e tentava orientar e assessorar o estado-maior brasi­leiro e seus comandantes de unidades, a fim de criar urna organização altamente eficiente”. O Comandante do Corpo, General Crittenber-ger, manteve um contato pessoal tão estreito com o General Mascare­nhas, que só em novembro visitou-o vinte vezes e consultou-o pelo telefone seis vezes. Os americanos acreditavam que uma supervisão cer­rada, “mais treinamento” e a absorção das “amargas lições aprendi­das em combate” desenvolveriam cabalmente o potencial da divisão. Na opinião do estado-maior do 4? Corpo, “a maioria do pessoal” era “inteligente e ativa”, e, com o tempo, “daria bons e rijos soldados”.

A avaliação do desempenho brasileiro é, de certa forma, confun­dida pelas exigências da diplomacia. Vernon Walters, que como ofi­cial de ligação do 5? Exército junto à FEB provavelmente conhecia os pontos fortes e fracos da divisão melhor do que qualquer outro ameri­cano, comentou em suas memórias que os soldados brasileiros “justi­ficaram a fé que se teve neles” e estiveram em “combate contínuo (…) sem substituições” por 239 dias. As declarações públicas de Mark Clark sempre foram lisonjeiras, mas seu diário e as entrevistas com o seu bió­grafo revelam insatisfação e talvez frustração por ter tido que incluir em seu comando uma divisão cujos oficiais subalternos tinham difi­culdade em controlar seus homens mal treinados sob o fogo do inimi­go. O biógrafo de Clark conta que ele considerava Mascarenhas um oficial “inconstante, uma palavra-código para não confíável”, que “da­va desculpas e via a presença dos brasileiros na Itália como um meio de ganhar prestígio; não estavam lá, disse ele francamente a Clark, pa­ra serem feitos em pedaços”. Em particular, Clark inclusive avocou a si o crédito por ter organizado a ofensiva sobre o Vale do Pó de tal modo que a FEB aceitasse a rendição de grandes unidades do inimigo. No entanto, após a guerra Mark Clark foi ao Brasil participar da re­cepção à FEB e voltou de novo em 1949, transbordando de entusias­mo em ambas as ocasiões.

Não é claro o que o sucessor de Clark no comando do 5° Exérci­to, Lucian K. Truscott, pensava sobre os brasileiros. No seu livro a respeito dos últimos dias da campanha, ele descreveu a derrota da 148? para a FEB como “espetacular”, e no prefácio da edição brasileira na­turalmente elogiou a contribuição da FEB. No entanto, seu relaciona­mento com os brasileiros era frio, embora correio. O Chefe do Estado-Maior Floriano de Lima Brayner considerava-o “taciturno”, “retraído” e evidenciando uma “confiança limitada” na tropa brasi­leira. Compara-o desfavoravelmente com Clark, que estimulava os bra­sileiros ao exigir muito deles, mesmo que aparentemente não se mostrasse nada entusiasmado. “Para nós, latinos, ele era um mau psi­cólogo. Não sabia sorrir”.  Não posso dizer que tenha sido por causa desta falta de entusiasmo, mas o Exército brasileiro não convidou Trus­cott para acompanhar Clark e Crittenberger ao Rio de Janeiro, para a festa de boas-vindas à FEB, em 18 de julho de 1945. Quando tenta­ram consertar as coisas com um convite tardio, ele encaminhou o as­sunto ao Departamento de Guerra dizendo que “Visitar o Brasil nessas circunstâncias parece desnecessário, a menos que motivos de política mais alta indiquem o contrário. Não desejo comparecer a qualquer ce­lebração no Brasil, o que só poderá fazer com que me sinta embaraça-do(…) Espero que o Departamento não seja favorável à minha ida! Uma operação de coalizão é, em sua base, um relacionamento de per­sonalidade e estilos nacionais, exigindo compreensão e esforço deter­minado de todos para funcionar.

A FEB completou todas as missões que lhe foram confiadas e po­de ser comparada favoravelmente com as divisões americanas do 4? Corpo. É lamentável que o forte simbolismo de Monte Castelo tenha distorcido a análise da vitória em Montese, a 16 de abril, na qual a FEB tomou a cidade, sofrendo 426 baixas após uma batalha extenuan­te de quatro dias de duração. Nos dias seguintes, combateu a 148? Di­visão (alemã) e as divisões Monte Rosa, San Marco e Itália (da Itália fascista), as quais acabaram por se render ao General Mascarenhas nos dias 29 e 30 de abril. Em uma questão de dias, os brasileiros, graças a uma armadilha bem-sucedida, conseguiram a rendição de dois gene­rais, 800 oficiais e 14.700 soldados. É duvidoso que Clark pudesse ter “dado um jeito” para que os brasileiros fizessem isso, mas não se po­de negar que pretendia que eles detivessem a retirada dos alemães. Na verdade, seu comentário pode estar ligado ao fato de a 148? Divisão ter sido a única entre as alemãs a se render intacta naquela frente. De qualquer modo, Mascarenhas fez questão de esperar até ter recebido a rendição e estar com os prisioneiros sob sua guarda para só então notificar o quartel-general americano do seu sucesso. O que parece claro é que, embora com pouca preparação e servindo sob comando estran­geiro, os soldados da “cobra fumando” mostraram, como aparece em uma de suas canções, a “fibra do Exército brasileiro” e a “grandeza de nossa gente”.

CONCLUSÃO

O sucesso da FEB foi de tal ordem, que os líderes americanos pre­tenderam que ela permanecesse na Europa como parte das forças de ocupação, papel que os militares brasileiros e seus líderes civis rejeita­ram. Infelizmente, contrariando as objeções americanas, o governo bra­sileiro decidiu dispersar a FEB por ocasião do seu retorno ao Brasil. Os militares americanos tinham esperado que a divisão fosse conser­vada junta para formar o núcleo de uma reformulação completa do Exército brasileiro. Os veteranos da FEB, como Humberto Castello Branco, introduziriam aos poucos as lições da guerra nos currículos da Escola de Estado-Maior e na Escola Militar. Mas a chance de usar a experiência da FEB para projetar a influência brasileira na ordem do pós-guerra foi perdida. Aqueles que, no final de 1945, tomaram as rápidas decisões que levaram ao fim da FEB não podiam saber quão rapidamente os Estados Unidos iam se desmobilizar, ou quão rapida­mente a aliança com a União Soviética entraria em colapso. Se o Bra­sil tivesse mantido tropas de ocupação na Europa e um quadro permanente de pessoal com experiência de combate em seu território, talvez tivesse conseguido uma posição pós-guerra muito diferente. A rejeição por parte do Brasil de integrar as operações militares nas guerras da Coreia e do Vietnã é parcialmente relacionada com a percepção nacional de que os Estados Unidos não apreciaram adequa­damente sua contribuição na II Guerra Mundial. E esta percepção é relacionada com o modo pelo qual a história da guerra é compreendi­da no Brasil e nos Estados Unidos.

 

Frank D. McCann

Departamento de Historia

Universidade de New Hampshire

Fonte: A Luta dos Pracinhas – 3ª Edição revista e aumentada

Sobre Ricardo Lavecchia

Desenhista, Ilustrador e pesquisador sobre a Segunda Guerra Mundial

Veja também

Defesa Passiva Antiaérea Durante a Segunda Guerra Mundial

Defesa Passiva Antiaérea Durante a Segunda Guerra Mundial

Relatos e histórias de uma veterana Existem relatos históricos contundentes, heroicos e emocionantes, que não …

5 comentários

  1. Frank D. McCann é simplesmente inigualável. William Waack teria de comer muito feijão só para poder amarrar os sapatos dele.

  2. Maria do Socorro Sampaio M. de Barros

    Tenho sentido imensa alegria com o interesse dessa juventude sobre a Segunda Guerra Mundial. O Ricardo tem feito um resgate necessário antes que nossos verdadeiros heróis façam parte apenas da memória. Parabéns!

  3. antonio gonçalves

    não entendo. como o william,prefere acreditar em documentos alemães onde jamais iriam registrar ali. os fatos como se deram,uma vez que se renderam mesmo sob ameaças de terem suas respectivas familias assasinadas. o minímo que que poderiam fazer dianto do fato era amenizalo.

  4. ANTONIO CARLOS LUCA DE SOUZA

    BOM DIA!

    Não consigo ententer o porquê que das melhores e mais vitoriosas batalhas da história do exército brasileiro,mesmo em guerras civis,os mais bravos,inteligentes e audaciosos guerreiros brasileiros,os soldados gaúchos ficaram de fora da FEB;ou foram minoria?
    Que país deixa de fora seus mais nobres guerreiros e espera respeito DOS EUA e do mundo?

  5. ANTONIO CARLOS LUCA DE SOUZA

    MEU AVÔ FOI CABO INSTRUTOR ,E SERVIU À PÁTRIA DURANTE TODA A GUERRA.ELE FOI CONDECORADO E SERVIU POR O6 ANOS À PATRIA.POR QUE A FEB NÃO LEVOU A ELITE DO EXÈRCITO BRASILEIRO?
    OS GAÚCHOS SEMPRE FORAM DESTAQUES NAS GUERRAS.
    OS AMERICANOS ZOMBARIAM SE SOUBESSEM DESTES FATOS,
    QUE A FEB DEIXOU PARA TRÁS SEUS MELHORES GUERREIROS?
    E QUE O BRASIL TRATOU COMO LIXO E DESINTEGROU A FEB ANTES DO TEMPO,E NINGUÉM FALA QUE VÁRIOS EXPEDICIONÁRIOS VIRARAM MENDIGOS?
    POR QUE NINGUÉM NUNCA FALOU DE COMO OS GUERREIROS DA FEB FORAM HUMILHADOS QUANDO DESEMBARCARAM EM SOLO BRASILEIRO?
    POR QUE NINGUÉM FALA QUE ELES FORAM TRATADOS PIORES DO QUE PRISIONEIROS DE GUERRA? QUE FARSA! SORTE QUE O NOSSO POVO NÃO ESTÁ NEM AÍ.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *