O valor do maciço Belvedere-Castelo residia, é sabido, de imediato, em espiar para dentro das linhas brasileiras, num raio de 10 milhas. Todos os nossos movimentos de retaguarda apesar das caprichosas dobras em que o terreno se vai adoçando, do maciço aos vales do Sila e do Reno, eram difíceis de disfarçar. E o inimigo nos canhoneava, comodamente, do alto de suas posições dominantes, o recurso da neblina artificial, envolvente, irritante, a nos roubar o sol e impotente para evitar o sigilo do tráfego; urgia tomá-lo a qualquer preço. Contra a FEB tramavam, porém, mais que a vigilância do boche, a neve e o frio, entorpecentes, desconhecidos dos brasileiros, filhos dos trópicos – 18 graus abaixo de zero, marcava tantas vezes o termômetro, ao relento das frígidas madrugadas dos Apeninos…
Atacaram, todavia; o soldado tem que ser superior ao tempo, diante de resultados compensadores. Várias tentativas se frustraram, antes que obtivessem a espetacular vitória de fins de fevereiro. Frustradas, sim, mas repassadas de atos heróicos dos soldados do Brasil!
O mais emocionante deles foi, sem duvida, o que resultou do ardor ofensivo do Soldado JOÃO F. SILVA, – da Companhia Mandim, Batalhão Uzêda -, e que só o êxito assinalado permitiu conhecer: Seu cadáver foi encontrado, semi-conservado pela neve, em atitude agressiva, fuzil em riste, na plateau do Castelo, já dentro do que fora antes, uma linha interna do reduto alemão.
No ardor da refrega, João Silva não se dera conta que seus camaradas haviam já pago com a vida a audácia do temerário ataque: avançara sempre, só, resoluto, intimorato, em meio aos “rasga-trapos” das lurdinhas e ao ensurdecedor ribombar dos morteiros, encostas acima – nada o acovardou, sequer pensou em si. Levava no recesso do peito ofegante um coração brasileiro e diante dos olhos aguerridos, numa alegoria do dever, a imagem da Pátria distante, que buscava desagravar frente ao boche fanático e em terras estranhas.
Certo, tinha consciência da morte. Sabia que não voltava. Tampouco, que poderia vencer. “Sei que morro” terá pensado, pressentindo seus últimos instantes de vida, “mas ainda que cadáver, meu corpo balizará, no topo do Castelo, o rumo da vitória aos companheiros que vierem depois”. E tombou como um conquistador, solitário embora, linhas inimigas adentro! Mas tão logo a primavera repontou nos Apeninos recalcando a neve e atenuando o frio, seguindo as pegadas já quase ilegíveis de João Silva, seus companheiros foram buscar seu corpo e o “monte tabu” tombava às mãos dos briosos infantes do Regimento Sampaio!
JOÃO SILVA! Foste vingado! E teu exemplo ficará para sempre, como um símbolo: o do infante brasileiro que empunhando o seu fuzil, só vai à batalha para vencer ou morrer! Possa tu ouvir, do recesso dos céus, Soldado João Silva, a homenagem que te prestam o teu comandante e os teus camaradas do Sampaio, e que tua bravura nos inspire, a todos nós, no rumo da vitória contra o tirano alemão.