Passados mais de 60 anos do fim do regime nazista na Alemanha, as vítimas seguem lutando por seus direitos. Neste caso falamos dos antigos operários dos guetos judaicos, que trabalhavam em fábricas alemãs – “voluntariamente”. Eles recebiam salário, tendo, portanto, direito à aposentadoria.
Porém, pela inexistência de contracheques, hoje faltam aos aposentados comprovantes essenciais para fazer valer seus direitos perante o Estado alemão. Em 2002 houve aprovação da legislação sobre as aposentadorias dos guetos.
No entanto, quase todos os pedidos foram negados pela previdência alemã. Mas agora, no início de junho, o Tribunal Social Federal (BSG) de Kassel deu ganho de causa a três aposentados.
Corrida contra o tempo
Uma corrida contra o tempo, já que os requerentes são bem idosos. Alguns eram crianças, a maioria jovem adultos, ao serem enviado para um gueto no Leste Europeu. Lá, o trabalho era obrigatório, por isso muitos trabalhavam diariamente até a exaustão.
Eles recebiam alguma compensação, fosse por comida ou cupons de racionamento, ou com algum dinheiro vivo. Alguns até pagavam contribuições sociais, porém a maioria não recebe qualquer forma de pensão até hoje.
Somente há dez anos os historiadores provaram que, além dos trabalhadores forçados, os nazistas empregavam judeus nas fábricas alemãs. Deste modo, além de justiça, esses sobreviventes do Holocausto requerem compensação financeira.
Vida no gueto e “trabalho voluntário”
Após a aprovação unânime, pelo Bundestag – parlamento alemão, sucessor do Reichstag -, da lei das aposentadorias dos guetos, 70 mil sobreviventes aproveitaram o prazo até 30 de junho de 2003 para apresentar seu pedido à previdência alemã. Antes, o Parlamento já reconhecera o direito dos trabalhadores forçados.
Com a intenção de distinguir juridicamente o trabalho no gueto do trabalho forçado, os requerentes de aposentadoria deveriam provar convincentemente ter servido aos nazistas “por decisão própria” e “mediante remuneração”.
Uma tarefa complicada, pois, “voluntário” é um termo incompatível com a permanência dos judeus nos guetos. Além disso, durante aqueles anos difíceis, muitos tiveram seu pagamento com alimentos ou cupons, não havendo um sistema clássico de vencimentos.
Exigências rigorosas
À maioria dos atingidos só restou obter sua causa juridicamente, ou seja, entrar com processo junto aos tribunais sociais dos estados. Na ausência de contracheques – inexistentes, na situação – cada documento histórico ou pessoal servia para afastar toda dúvida.
Mas, para muitos, retornarem à Alemanha era impensável; outros não tinham condições físicas, devido à idade ou questões de saúde.
O Deutsche Rentenversicherung Rheinland, órgão da previdência responsável pelos sobreviventes de Israel, só aprovou cerca de 1.500 requerimentos; mais de 90% foram negados, por não se considerarem preenchidos os pré-requisitos.
Novo paradigma
Na terça-feira (02/06), em três acórdãos, o 13º Senado do BSG decidiu que a previdência alemã passa a reconhecer o trabalho dos judeus nos guetos nazistas. E na quarta-feira o 5º Senado fortaleceu essa decisão. Então, a maioria dos 70 mil solicitantes terá direito à aposentadoria pela Alemanha.
Quem moveu os processos junto à Justiça alemã foram dois homens e uma mulher entre 80 e 87 anos de idade. Durante a Segunda Guerra Mundial eles trabalharam para empresas alemãs em guetos na Polônia e em Belarus.