Negligência salvou o General – Histórias da FEB
Nesse texto abaixo podemos a negligência de oficial e omitir uma doença e mesma negligência lhe salvou a vida.
Essa história se passa durante o terceiro ataque ao Monte Castelo, O Dr. Marjor Alípio não cita o nome do general, mas pela bravura só pode ser um brasileiro.
Entre os heróis da última tentativa de avanço conta-se o nosso capitão J .B., oficial classificado no estado maior de um dos generais brasileiros, mas que quis sentir de perto as agruras da ação direta. Portou-se com valentia e denodo, mas foi atingido em pleno peito pela rajada de metralhadora adversa, provocando-lhe fraturas expostas de quatro costelas e ampla ferida do pulmão direito. Esteve perdido no campo de luta num desvão da montanha, suportando frio abaixo de zero, sob chuva miúda, esvaindo-se em sangue. Encontrado pelo seu ordenança em estado de hibernação natural, já que estava deitado sobre a neve, chegou a tempo, graças a essa circunstância, de ser posto fora de perigo pela enérgica e eficaz atuação da nossa segunda equipe cirúrgica.
O caso deste oficial parece-nos singular. Ao radiografá-lo, para se avaliar a extensão das lesões, fomos todos nós surpreendidos por uma situação insólita. As radiografias do pulmão direito revelavam tipicamente a existência de caverna tuberculosa. Os nossos colegas norte-americanos tornaram-se altamente embaraçados para entender a situação, porque positivamente a doença deveria ser antiga, datando de mais de ano e o nosso homem viera havia poucos meses. Eles não atinavam de como poderia ele ter passado pela inspeção médica, sem se verificar o seu gravíssimo estado de saúde, que também era ameaça para todos os que tivessem convivência com ele. A nós foi difícil encontrar explicação. O oficial fugiu à inspeção sanitária, pois era conhecedor de sua doença. Pediu para comandar uma companhia no afoito assalto contra o inimigo solidamente entrincheirado no topo do monte. Lá avançou de peito aberto, atirando granadas de mão, deixando bem para trás os seus comandados, enfrentando as metralhadoras bem postadas, em marcha solitária, heróica e louca para a morte. A prova de que ele conhecia a natureza e a gravidade de sua moléstia está no fato de ter recusado asperamente um recipiente usado para colher escarro, que é só do conhecimento dos laboratórios. Ao lhe apresentar a placa de Petrí, onde deveria escarrar, afirmou:
— Não preciso disso, nada tenho nos pulmões, sou homem sadio. Esta cena se verificou no período pós-operatório. E o exame comprovou ser verdadeira a suspeita, isto é, a tuberculose cavernosa.
Mas o destino, que guarda nos ferrolhos de seus caprichos as mais inesperadas surpresas, não o quis ver morto. A doença, que o incentivou aquela atitude desesperada, salvou-o definitivamente. Desta maneira que a patologia explica. Como era ele um tísico, tuberculoso crônico, o seu pulmão estava preso às costelas por meio de aderências fibrosas; aberto o tórax pela rajada de balas, órgãos respiratórios não se retraiu e ele pôde continuar a respirar o suficiente para oxigenar convenientemente o sangue. Se fosse são, com aquela enorme abertura no peito, o pulmão retrair-se-ia e o ferido morreria certamente asfixiado na impossibilidade de encher de ar o seu peito. Este é um dos inesperados caprichos da natureza. Com tratamento adequado poderá salvar-se, se escapar da lesão traumática.
Ele vai indo muito bem no pós-operatório, mas está rigorosamente isolado.
Fonte: Notas de um Expedicionário Médio
Alípio Corrêa Netto
Pag. 55-55