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Futebol e Segunda Guerra – pelo Leitor

Futebol e Segunda Guerra – PALAVRA DO LEITOR

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Sindelar

A história dos Atletas confinados num campo de concentração é razoavelmente conhecida. Mas existiram outras ligações entre futebol e guerra, menos conhecidos.

E podemos começar com os antecedentes da guerra. Em março de 1938 Hitler invadiu e anexou a Áustria. A Seleção Austríaca, sensação da época (era chamada de Wunderteam – equipe maravilhosa), já classificada para o Mundial, onde era favorita, foi dissolvida. Seus melhores jogadores foram incorporados à Seleção Alemã, mas o craque do time, Sindelar, recusou-se a vestir a camisa do selecionado nazista. Alegava lesões e idade elevada (estava com 35 anos). Mas o fato é que ele era antinazista e sua esposa era de origem judaica. Em janeiro de 1939, Sindelar e sua mulher morreram asfixiadas por monóxido de carbono de um aquecedor. Oficialmente, sua morte foi considerada acidental, mas hoje a maioria dos historiadores considera que o casal suicidou-se ou foi assassinado pelos nazistas, pois existem documentos da Gestapo que provam que o jogador estava sendo investigado pela polícia política nazista.

A partir da temporada de 1939, o campeonato alemão (que era regionalizado) passou a contar com clubes da Áustria e de partes da Tchecoslováquia. O Rapid Viena chegaria a ser campeão alemão em 1941 e o Admira Viena e First Viena foram vice-campeões (1939 e 1942).

Quando a guerra começou, os países ocidentais cancelaram seus campeonatos oficiais, mas a Alemanha e seus aliados mantiveram suas competições, como política de estado. Joseph Goebbels, ministro da propaganda nazista, dizia que:

“Uma vitória no campo de futebol é mais importante para a população do que a conquista de uma cidade em território inimigo: o futebol faz com que as pessoas sofram menos com o cenário de um país em guerra, um dia-a-dia com dificuldades de abastecimento e filhos nos campos de batalha ou mortos”.

O campeonato alemão se manteve até 1944. Embora, aos poucos, clubes das forças armadas começassem a surgir entre as equipes tradicionais. O vice-campeão alemão de 1944 foi o Luftwaffen SV Hamburg, time da Força Aérea. No segundo semestre de 1944 a guerra começava a bater nas portas da Alemanha, e a necessidade de soldados era imensa. Por isso, a temporada de 1944/1945 foi cancelada.

A Eslováquia, parte da Tchecoslováquia que não foi incorporada oficialmente à Alemanha Nazista, mas foi declarada independente, com um governo fantoche pró-nazista, também organizou campeonatos de 1939 a 1944. A temporada de 1944/1945 chegou a iniciar, mas foi abandonada em setembro de 1944. Na Áustria, o antigo campeonato nacional, agora relegado a campeonato regional da Alemanha, manteve-se ativo até 1944, tb.

Após a invasão da Iugoslávia, os nazistas criaram o estado fantoche da Croácia, que organizou campeonatos de 1941 a 1943. O campeonato de 1944 foi abandonado, com a aproximação das tropas soviéticas e às ações da guerrilha partizan.

Na França, após a derrota, foram disputados dois campeonatos (que não são considerados oficiais pela atual federação francesa). Um campeonato do Norte, na zona ocupada pelos nazistas, e outro no sul, no governo de Vichy. Esta estrutura se manteve de 1940 a 1943. Em 1944 foi disputado um campeonato de seleções regionais, e logo após a liberação francesa, no 2º semestre de 1944, manteve-se a estrutura de dois campeonatos, na temporada 1944/1945. Na França, mesmo com a guerra, a bola não parou de rolar.

O campeonato italiano manteve-se até 1943. Em 1944, com a Itália já dividida entre aliados e nazistas, foi organizado um campeonato no norte (fascista), que não é considerado oficial. O próprio time campeão, a equipe dos bombeiros de Spezia, não era oficial.

Em 1945, ainda durante a guerra, na Sicília libertada foi disputado um campeonato regional, vencido pelo Palermo.

Nos aliados alemães: a Romênia manteve seu campeonato oficial em 1940 e 1941. Em 1942 o campeonato foi cancelado. Em 1943 foi disputado um campeonato de guerra, extra-oficial, e em 1944 o campeonato foi abandonado, devido ao conflito.

Na Hungria, o campeonato oficial foi disputado até 1944, e no 2º semestre de 1944 foi disputado um torneio extra-oficial.

E na Bulgária, o campeonato foi disputado até 1943. A temporada de 1944 não chegou ao fim.

Na Itália, o fascismo interferia, e muito, no futebol, mesmo antes da guerra. A Internazionale teve de mudar o nome para Ambrosiana, pois Mussolini considerava que o nome do clube lembrava a IC (Internacional Comunista).

Como não havia na capital romana nenhuma equipe em condições de disputar o título italiano, em 1927, Mussolini pressionou os clubes da cidade a fundirem-se em um só. Alba, Roman, Pro Roma e Fortitudo aceitaram a pressão e fundiram-se, dando origem à atual Roma. Apenas a Lazio não aceitou participar da fusão. Em 1942, na partida decisiva do campeonato, Mussolini estava presente no estádio, torcendo abertamente para a Roma, que contou com a simpatia do juiz…

Curiosamente, após a guerra a Roma passou a contar com a simpatia da esquerda, enquanto a Lazio, que já possuía relações com o fascismo (só por isso pode dizer não à ordem de Mussolini), congrega os adeptos do MSI (nome atual do partido fascista).

Na Copa do Mundo de 1938, exilados italianos e a torcida francesa vaiaram a Itália, na sua estreia na Copa. Mussolini ordenou que a Itália disputasse o resto do Mundial de camisas negras, as cores do fascismo.

Dizem que a incorporação dos jogadores da seleção “Wunderteam” austríaca no time alemão em 1938 foi uma coisa boa apenas no papel, pois teria desentrosado de um certo jeito o time alemão.

Na Copa do Mundo de 1938, realizada poucos meses depois na França, a Alemanha foi logo eliminada pelo time da Suíça. A Copa foi vencida pela Itália, cujo capitão (não me lembro do nome) saudou Mussolini então presente ao receber o troféu Jules Rimet. Só que esse capitão da squadra azzura teria participado da guerrilha contra o regime de Mussolini durante a Segunda Guerra.

E há claro o episódio dos jogadores do Dynamo de Kiev que venceram uma ou duas partidas contra jogadores alemães em 1942, episódio que serviu de inspiração para o filme “Fuga Para a Vitória”

A Copa do Mundo de 1942, cancelada pela guerra, deveria em principio ter sido realizada na Alemanha. Mas como muita gente não simpatizava com o regime nazista, estudou-se a possibilidade de sediar a Copa no Brasil. Isso por causa da boa impressão deixada pelo time brasileiro na Copa do mundo de 1938 (3º colocado e tendo Leônidas como artilheiro).

O próprio Jules Rimet, presidente da FIFA, visitou o Brasil em 1939 para verificar as condições dos estádios.

Sobre Andre Almeida

Ex-militar do exército, psicólogo e desenvolvedor na área de TI.Sou um entusiasta acerca da Segunda Guerra Mundial e criei o site em 2008, sob a expectativa de ilustrar que todo evento humano possui algo a ser refletido e aprendido.

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