Jack G. Ammon e a Fé em Meio à Guerra

Jack G. Ammon era um americano comum que, em 1944, viu sua vida mudar ao deixar os Estados Unidos e chegar à Europa em pleno conflito. Cabo da Companhia C do 137º Batalhão de Manutenção de Artilharia, parte da 4ª Divisão Blindada, ele não era apenas um soldado. Carregava um trompete e uma fé que o ajudariam a enfrentar os dias mais duros da Segunda Guerra Mundial. Seu relato pessoal nos leva aos campos da Normandia, na França, e revela como a guerra testou seus limites e moldou seu futuro.

Em janeiro de 1944, Jack cruzou o Atlântico e desembarcou em Cardiff, no País de Gales. Por seis meses, ficou aquartelado em Wiltshire, perto de Devizes, na Inglaterra, preparando-se para o combate. Em julho, atravessou o Canal da Mancha e pisou em Utah Beach, na Península de Cherbourg, logo após o Dia D. Como escriturário da companhia, organizava documentos, mas também tocava o “church call” no trompete, chamando os soldados para os cultos. Foi nesse ambiente que conheceu o capelão Ray, um texano grande e forte que usava lutas de wrestling para levar os homens à igreja. Ray desafiava os soldados e, quase sempre invicto, os convencia a cumprir a promessa de aparecer nas cerimônias.

Uma semana após chegar a Utah Beach, Ray apareceu num jipe e fez uma proposta simples. Perguntou ao cabo se ele gostaria de ser seu assistente. Surpreso com a humildade do oficial, Jack pediu um tempo para orar. Ray concordou, mas deu um prazo curto. A divisão partiria às 4h da manhã seguinte, e ele precisava da resposta antes. Jack orou, sentiu um “vá” em seu coração e, às 3h, confirmou que seguiria o capelão. Assim começou uma parceria que o levaria ao centro da Operação Cobra, a ofensiva aliada que abriu caminho nas linhas alemãs em julho de 1944.

A 4ª Divisão Blindada avançava na ponta direita do Terceiro Exército, rumo ao sul, perto de Coutances. Num dia agitado, Jack e Ray, juntos num jipe, viram dezenas de soldados alemães se rendendo, saindo dos bosques com mãos erguidas. O capelão pediu que Jack voltasse ao batalhão médico para buscar um reboque e levasse três prisioneiros ao estoque de detidos. Ele aceitou, mas esqueceu um detalhe arriscado. Seu fuzil ficou no chão do jipe, aos pés dos alemães. No caminho, enquanto via veículos americanos ao lado, sentia-se seguro. Mas logo ficou sozinho na estrada com os três prisioneiros. Sem aliados por perto, virou o jipe e se deparou com quatro ou cinco soldados alemães apontando armas a poucos metros.

Sem saída, Jack abaixou a cabeça no volante e orou. “Senhor, estou em suas mãos. Amém”, disse em silêncio. Logo, foi capturado. Um oficial médico alemão, que cuidava de feridos na floresta, assumiu o jipe e o levou a um celeiro. Após uma conversa com outro oficial, o médico o surpreendeu. Disse que ele podia ir até uma colina próxima e se juntar aos “camaradas”. Jack estranhou a palavra, mas logo encontrou oito americanos capturados do 46º Batalhão Médico. Juntos, rezaram e cavaram uma trincheira, temendo bombardeios, possivelmente até dos próprios Aliados.

Os alemães os levaram a Rennes, onde Jack foi colocado num hospital improvisado para soldados aliados feridos. Por quatro dias, ajudou pacientes, muitos ingleses com sotaques difíceis de entender. Quando os americanos se aproximaram, o prédio levou dois impactos leves. Na quarta manhã, ele viu pela janela um jipe com três estrelas, sinal de um general próximo. Tanques derrubaram o arame farpado, e Jack ajudou a carregar feridos em ambulâncias. Livre, voltou ao capelão Ray, que o recebeu com um carinhoso “O Governador”, apelido ganho numa cidade francesa libertada, quando um menino lhe ofereceu cerveja.

Essas vivências na guerra marcaram Jack profundamente. Após o conflito, ele dedicou 36 anos ao ministério cristão, inspirado por Ray e pelas provações que enfrentou. Em 2009, já capelão da 4ª Divisão Blindada, escreveu esse relato, notando que o encontro daquele ano em Washington poderia ser o último dos veteranos, que estavam “partindo”. Para Jack, a fé foi sua força no caos da Normandia, uma lição de resistência e humanidade que ecoa até hoje.

Sobre Ricardo Lavecchia

Trabalho como vendedor, mas tenho como hobby desenhar e pesquisar sobre a Segunda Guerra Mundial.

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