Imagine um carro que rodou por estradas empoeiradas, carregou oficiais de alta patente e testemunhou decisões que mudaram o rumo da história. Agora pense que esse mesmo veículo sobreviveu ao tempo, à guerra e até a ordens de destruição, para hoje ser um símbolo de memória e respeito. Esse é o caso do Pontiac Silver Streak 1941, um clássico americano que carrega em suas linhas cromadas e motor robusto uma trajetória impressionante ligada à Segunda Guerra Mundial. Para seu atual dono, Rob Atchison, esse carro é mais do que um objeto de coleção — é uma homenagem aos que lutaram e se sacrificaram, dos dois lados do Atlântico.
O Silver Streak surgiu em 1935, lançado pela Pontiac, divisão da General Motors, com o slogan “a coisa mais bonita sobre rodas”. O nome vem das barras cromadas paralelas que cortam a grade frontal e se estendem pelo capô, como se gritassem velocidade e elegância. Sob o capô, um motor seis cilindros de quatro litros, com válvulas laterais, acoplado a uma transmissão de três marchas com alavanca na coluna. Era um conjunto confiável, testado pelo tempo. Os modelos de quatro portas eram vendidos para civis, mas os de duas portas, como o de Rob, tinham um destino mais nobre: servir como carros de estado-maior para oficiais importantes.
Esse Pontiac em particular é um dos últimos fabricados antes que a produção civil fosse interrompida pelo ataque a Pearl Harbor, em 7 de dezembro de 1941. Depois disso, as fábricas americanas viraram suas linhas para produzir tanques, jipes e qualquer coisa que ajudasse a derrotar o Eixo. Em 1945, com a guerra encerrada, o governo dos EUA ordenou a destruição de milhares de veículos militares excedentes para evitar uma enxurrada de carros usados no mercado interno. Muitos foram perdidos para sempre, mas o Silver Streak de Rob, registrado como 540 UXF, escapou desse destino. Ele encontrou abrigo no museu da Base Aérea de Travis, na Califórnia, e hoje é considerado uma raridade — dizem os registros que apenas 400 unidades militares foram feitas, e este pode ser o único exemplar de duas portas ainda existente.
A história desse carro fica ainda mais fascinante quando descobrimos quem pode ter sentado ao seu volante: o Brigadeiro-General Robert F. Travis. Nascido em 1905 em uma família militar, Travis escalou os ranks com determinação. Nos anos 1930, comandou esquadrões de bombardeiros e serviu como oficial de inteligência. Durante a Segunda Guerra, entre 1943 e 1944, voou 35 missões a partir do Reino Unido, antes de retornar à base Fairfield-Suisun, na Califórnia. Sua carreira continuou em ascensão até que, em 1950, morreu em um acidente com um B-29 durante a Guerra da Coreia. Em sua homenagem, a base onde serviu foi rebatizada como Travis Air Force Base. O Pontiac ficou exposto no museu local até 2004, quando foi levado para o Reino Unido após o fechamento do espaço.
Chegando em solo britânico, o carro precisou de cuidados sérios para voltar à vida. O novo dono instalou pneus novos, converteu o sistema elétrico para 12 volts, reconstruiu os freios e trocou o carburador. Depois, uma pintura completa em estilo da 101ª Divisão Aerotransportada deu ao Silver Streak um visual de combate, enquanto os bancos foram refeitos com tecidos fiéis à época. Anos depois, o carro chegou às mãos de Rob Atchison, um açougueiro apaixonado por clássicos como Triumph TR4A, MG Midget e Vauxhall Velox.
Rob conta como encontrou o Pontiac: “Em 2018, eu queria um hot rod para passear. Vi o anúncio desse Silver Streak, li a história, vi as fotos e pensei: ‘É isso!’ Comprei ele com um monte de documentos históricos. Já tinha passado por uma restauração, mas estava precisando de amor. A pintura verde fosca estava feia, o motor não estava bom. Troquei embreagem, vedações de óleo, tirei o motor pra revisar e refiz o interior como era em 1941.”
Os detalhes do carro são um tributo ao passado. O relógio interno, por exemplo, está travado às 8h — o horário do ataque a Pearl Harbor. Na placa, a inscrição “Longest Day” remete a um poema que Rob escreveu em 2004, lido pelo veterano Harry Billinge em um vídeo no YouTube. O Pontiac já apareceu em programas de TV e filmes, e em 2025 levou o prêmio “Escolha do Diretor” no Cofton American Car Show. “Ela dirige bem pra uma senhora de 83 anos,” diz Rob. “Não vou muito longe, mas onde ela passa, atrai olhares. É uma forma de manter viva a memória dos que serviram e inspirar os mais jovens.”
Para quem entende de carros militares, o Silver Streak é um pedaço de história sobre rodas. Não é só a mecânica ou o design — é o que ele representa. Um sobrevivente da Segunda Guerra que atravessou décadas para nos lembrar do custo da liberdade.