O Dia em que Aliados se Tornaram Inimigos: O Bombardeio Americano Contra Tropas Soviéticas em 1944

A guerra tem seus paradoxos, e um dos mais surpreendentes se revelou em novembro de 1944, quando forças aliadas, que combatiam o mesmo inimigo, se encontraram em lados opostos do campo de batalha. O caso, mantido sob sigilo por décadas, veio à tona recentemente com a revelação de documentos do arquivo histórico russo. Nele, a denúncia formal da União Soviética sobre um ataque brutal da Força Aérea dos Estados Unidos contra uma coluna do Exército Vermelho em território iugoslavo.

A guerra já se encaminhava para seus momentos finais na Europa quando, em 7 de novembro, uma coluna de veículos soviéticos se deslocava entre as cidades de Niš e Aleksinac, na então Iugoslávia libertada. Os soldados acreditavam estar seguros em uma área já consolidada pelo avanço das forças do Exército Vermelho. Mas o inimigo, dessa vez, veio do alto – e não era alemão.

Às 12h50, um esquadrão de caças P-38 Lightning, pertencente à Força Aérea dos Estados Unidos, surgiu no céu. O que aconteceu a seguir desafia qualquer explicação lógica: os pilotos americanos abriram fogo contra a coluna soviética, despejando metralha e bombas sobre os caminhões e soldados.

A resposta veio do aeródromo mais próximo, em Niš. Nove caças soviéticos de prontidão decolaram para interceptar os invasores, mas também foram atacados. O que deveria ser um erro logo se tornou um massacre. Mesmo diante dos claros sinais de identificação dos aviões soviéticos, os americanos insistiram no ataque por mais de 15 minutos.

O saldo foi trágico: o general soviético Kótov, comandante do corpo, morreu junto com dois oficiais e três soldados. Vinte caminhões foram destruídos, além de três aeronaves soviéticas abatidas, resultando na morte de dois pilotos. No solo, mais quatro militares foram atingidos quando os americanos passaram a atacar também o aeródromo.

Documento em russo sobre o acontecimento.

A perplexidade soviética se traduziu em um documento oficial enviado diretamente ao chefe da missão militar americana em Moscou, general John R. Deane. O tom da carta não poderia ser mais duro: os soviéticos afirmaram que a agressão era “injustificável” e “inexplicável”, destacando que a visibilidade dos símbolos da Força Aérea Vermelha afastava qualquer possibilidade de engano.

A questão que fica é: por que os americanos abriram fogo contra seus aliados? Erro humano? Falha de comunicação? Ou uma estratégia oculta dentro do grande xadrez geopolítico que já começava a ser montado para o pós-guerra?

O fato é que o episódio foi abafado na época, e a resposta oficial dos Estados Unidos nunca chegou a ser plenamente satisfatória. O incidente em Niš é um daqueles eventos da Segunda Guerra Mundial que demonstram que, mesmo diante de um inimigo comum, as alianças podem ser frágeis e os interesses, muitas vezes, se sobrepõem às vidas humanas.

Esse capítulo sombrio da guerra nos lembra que, em tempos de conflito, a verdade é uma das primeiras vítimas. E o que se esconde por trás dessa tragédia pode ser muito mais do que um erro de combate.

Sobre Ricardo Lavecchia

Trabalho como vendedor, mas tenho como hobby desenhar e pesquisar sobre a Segunda Guerra Mundial.

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