Bell P-63E Kingcobra-2
Bell P-63E Kingcobra

Operação Pinball – Treinamento de tiro com alvo tripulado

Quem diria que os norte-americanos, em plena Segunda Guerra, inventariam uma maluquice dessas: um alvo vivo, tripulado, para treinar artilheiros de bombardeiros! Ele, um sujeito qualquer, fuçando sabe-se lá o quê, tropeçou nessa história e ficou de queixo caído. Era o tipo de coisa que pedia pra ser contada, espalhada entre os amigos como um segredo suculento.

Bell P-63E Kingcobra

Corria o ano de 1943, e os Aliados viam seus B-17 e B-24 despencarem do céu como moscas sob o fogo dos caças alemães, pilotados por ases do Reich, daqueles com horas de voo que não acabavam mais. Os artilheiros dos bombardeiros, coitados, mal sabiam o que faziam – a defesa era um fiasco, um amadorismo que custava caro. As perdas batiam recordes, e a Oitava Força Aérea, sem saída, engavetou as missões sobre a Alemanha por quase quatro meses, só voltando em fevereiro de 44, quando os P-51 já podiam dar cobertura. O estopim viera em 14 de outubro de 43, um dia que ficou na história como “quinta-feira negra”: 77 aeronaves perdidas, 112 baleadas, 590 mortos e 65 capturados numa única surtida em Schweinfurt. Um banho de sangue.

Foi aí que resolveram botar a mão na massa e melhorar o treino dos artilheiros. Antes, o aprendizado era coisa chocha: alvos fixos no chão ou rebocados, munição de verdade, mas nada que simulasse o inferno de um combate de verdade. Até que o Major Cameron Fairchild, da USAAF, teve um estalo – desses que parecem delírio, mas que, de tão absurdos, brilham. Ele bolou um treinamento com caças tripulados, voando de verdade, levando tiro de munição quase real, feita de baquelite, que se espatifava ao acertar. As armas, claro, também foram mexidas pra não virar tragédia.

A coisa começou a engasgar logo de cara. Primeiro, escolher o bicho certo pra apanhar no ar. Tentaram o Douglas A-20, um bombardeiro bimotor, com blindagem extra no nariz e nas partes moles, mas o danado era lerdo demais – e o treino pedia algo mais parecido com os ágeis Me-109 alemães. Aí chamaram dois veteranos do Pacífico, o Capitão Charles T. Evercil e o Capitão JB Ronn, caras calejados. No começo, disseram a eles que era só um teste de munição nova. Quando a ficha caiu, o susto foi grande – só amansado depois de uns ensaios em terra firme.

Pensaram no P-51 Mustang, no P-47 Thunderbolt, mas esses estavam ocupados demais na guerra. Foi então que o Bell P-63 Aircobra, feito pra ir de presente pros soviéticos pelo Lend-Lease, entrou na dança. Blindaram o bicho todo, enfiaram sensores sob a couraça pra contar os acertos, e no lugar do canhão, no cubo da hélice, botaram uma luz vermelha que piscava a cada tiro bem dado – um jeito de os artilheiros calibrarem a mira. Virou RP-63, o “R” de “restrito ao combate”, só pra garantir que ninguém o confundisse com caça de linha.

Os pilotos dos RP-63, espertos, faziam passagens retas, paralelas aos bombardeiros, pra facilitar a vida dos atiradores. Mas nem tudo eram flores: os radiadores do bicho não aguentavam o tranco, viviam levando tiro e superaquecendo os motores. Deram um jeito com o RP-63G, que veio com blindagem reforçada, mas aí a guerra já estava no finzinho, e o projeto, tão ousado quanto esquecido, acabou virando só mais uma nota de rodapé na história.

Fonte: Revista francesa Aero Journal

Sobre Ricardo Lavecchia

Trabalho como vendedor, mas tenho como hobby desenhar e pesquisar sobre a Segunda Guerra Mundial.

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